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Ao longo da história, a força feminina foi perseguida a partir da ideia de "bruxaria" para fortalecer o patriarcado e o capitalismo
Angela Cruz* Publicado em 13/02/2025, às 18h00 - Atualizado às 21h14
As pessoas sempre buscaram maneiras para acalmar seus corações, convencer suas mentes e fazer desejos acontecerem — seja utilizando rituais, formulações invisíveis, cultuando crenças, acreditando no sobrenatural, em forças energéticas, cósmicas, dentre outras.
As mulheres, provavelmente por sua sensibilidade mais aguçada, relacionaram-se com maior intensidade a essas complexas fórmulas, que aplacam dores dos corações e mentes até os dias de hoje, servindo como socorro em tempos difíceis.
A humanidade sempre se valeu dos préstimos dessas pessoas, chamando-as de várias formas: feiticeiras, sacerdotisas, pitonisas, oráculos, curandeiras, benzedeiras, videntes, bruxas, cartomantes, macumbeiras e por aí vai.
Na pré-história, elas eram chamadas para curar doenças, uma vez que era a única medicina disponível naquele tempo — e por isso eram respeitadas. Todavia, quando os interesses foram se transmutando por conta das mudanças históricas e sociais, tais "serviços" e pessoas foram sendo desprezados, ridicularizados e até punidos.
No caso das mulheres, essas represálias foram ainda piores, pois a ideia que se construiu histórica e socialmente sobre uma "mulher bruxa" foi a de que ela teria poderes mágicos para praticar maldades.
Entretanto, essa construção ideológica serviu para fortalecer homens de poder, como reis, clero, nobreza e as sociedades patriarcais e capitalistas, fazendo com que as mulheres se tornassem conformadas reprodutoras de mão de obra. Assim, os homens alcançaram e mantiveram domínio e lucratividade em todos os sentidos.
Na pré-história, as mulheres tinham seus espaços de cultivo de alimentos e ervas curativas, de trocas de conhecimento; tinham poderes e autoridade em matéria de saúde, da natureza, das estações, da observação dos animais e dos corpos humanos; tinham controle da sua reprodução; e o mais importante: podiam trocar esses conhecimentos e se ajudavam mutuamente.
A preocupação com esse poder feminino que poderia lhes conferir posição privilegiada socialmente, aliada ao poder exclusivo da procriação, fonte de mão de obra para a produção de riquezas, despertou o interesse masculino de domínio sobre elas.
Mas como dominar e submeter sem destruir seus corpos úteis? Desconstruindo o conhecimento tradicional secular! Semeando crenças negativas e ameaçadoras que suscitassem medo em todos. Assim nasceu a ideia da "mulher bruxa" como um ser malévolo. E por isso, ela devia ser perseguida, violentada, escorraçada, torturada, excluída e morta.
Vários estudos comprovam que essa realidade existe até hoje, conforme aborda Silvia Fererici no livro "Calibã e a bruxa: Mulheres, corpo e acumulação primitiva". As mulheres, principalmente as pretas, estão entre as mais encarceradas no país, por exemplo. Além disso, ainda hoje muitas são expostas e têm seus corpos ou parte deles ridicularizados; são humilhadas ou colocadas em situações vexatórias; são desumanizadas nos hospitais, pois alguns médicos e enfermeiros tratam as doentes ou parturientes com violência e grosserias.
Essa perseguição se reflete também no comportamento violento de policiais que tratam mulheres como vagabundas e desonestas; de homens (maridos, pais, irmãos etc.), que ofendem, perseguem e as desrespeitam, praticando violência física e psicológica. Há ainda a violência, o desrespeito e a invisibilidade das mulheres trans, travestis e prostitutas, contra as quais se praticam todo tipo de maldade.
Este controle se salienta por meio das desigualdades instituídas entre homens e mulheres, como o salário, ou quando se define uma área por "trabalho feminino", a exemplo da educação básica.
Até bem pouco tempo atrás, não havia mulheres na polícia, no comando da istração de empresas, no Judiciário e no Legislativo. Sem contar que ainda não resolvemos duas questões cruciais: a do poder sobre os nossos próprios corpos e a do trabalho do cuidado.
O aborto continua sendo uma decisão pública, masculina e religiosa. Ainda são o Legislativo, o Judiciário e a Igreja — a maior parte constituída de homens — que decidem sobre os corpos femininos. Em paralelo, a maioria das pessoas sequer entendem ou aceitam a questão do cuidado, que é aquele trabalho invisível, não remunerado, realizado majoritariamente por mulheres (limpar a casa, lavar a roupa, cozinhar, cuidar dos filhos etc.).
Hoje, embora muitos estejam se dedicando à bruxaria, muita gente, por desconhecer o assunto, conserva um preconceito e medo dos (as) bruxos (as). Mas o maior problema é que se mantém essa ideia sobre mulheres, perpetuando o domínio sobre elas. Por isso, a cada tentativa de luta contra essa dominação, elas são ridicularizadas, escarnecidas e depreciadas, como fazem atualmente com as chamadas feministas. Todavia, apesar das represálias, a luta feminina persiste, como sempre resistiu historicamente e, somente assim, teremos uma sociedade mais igualitária e justa.
*Angela Cruz é advogada e professora universitária aposentada. Doutora em Direito, mestre em Educação Escolar e bacharel em Ciências Sociais e Ciências Jurídicas, sempre sonhou em escrever. Publicou coletivamente obras como “Os Gomes Regateiro no Brasil: histórias da imigração portuguesa” (2016) e “Depois da Festa: histórias e memórias dos egressos do Curso de Direito” (2021). Hoje, dedica-se integralmente à literatura e estreia na ficção com a saga épica “A Fênix Escarlate”, em que narra as reencarnações de uma feiticeira que luta pelos direitos das mulheres em diferentes momentos históricos.